Sobre desertos e oásis

Estou em crise, leitores, mas isso não é – a priori – problema de vocês. (Por favor não se sintam ofendidos, estamos trabalhando apenas com a verdade dos fatos aqui hoje.)

Uma crise existencial, de identidade, de meia idade, não sei. O que sei é que pela primeira vez na história das minhas faculdades mentais estou vislumbrando o futuro e isso me deixa confusa.

Não se trata de tentar uma carreira como sucessora de Mãe Dinah, muito menos de ter recebido um visitante misterioso (estranhamente parecido comigo mesma só que mais velha) que teria me presenteado com um almanaque esportivo dos próximos trinta anos (prevendo, claro, o Mengão sendo campeão direto e o Vasco, adivinha?, sendo vice).

Estou vendo apenas o meu futuro (e os leitores com clarividência já devem ter percebido que não estou curtindo a paisagem).

Nunca tive medo do escuro, de altura, ou do mar, mas essa visão do futuro está me assombrando as calcinhas há quase um mês. Tenho crises de ansiedade, choro, falta de ar, respiração acelerada. Procuro um saco de papel para respirar dentro, na falta de um, respiro na sacola de plástico do Guanabara (o que não me acalma porque lembro que a geladeira está metade vazia).

Aliás vejo tudo metade vazio ou ainda pior: absolutamente deserto. Mas, tipo, deserto padrão Fifa. Deserto do Saara mesmo. Desconfortável, poeirento, quente de dia, frio de noite e sem ninguém pra conversar.

Nessas horas o marido/namorado/noivo/rolo/rola há de ser um oásis, né mermo?

Difícil matar uma sede que não se sabe de quê. E não há quem possa te proteger do deserto que carregas contigo.

Entendo que algumas jornadas devemos percorrer sozinhos. O prolema é que só de cogitar uma ida ao cinema sem companhia eu já fico visivelmente desesperada. Imagina, então, o meu estado psicológico no momento.

Vamos pensar positivo e acreditar que o sinal do 3G pega bem no Saara. Quer dizer: vamos apelar para os amigos. Vejamos quem será a vítima…

Contatos… Amigos… A lista é curta, metade eu não vejo há anos, dos que vi recentemente – e seja generoso nesse conceito -, quase todos eu dei um jeitinho mágico de afastar. (Abre-se um portal onde me vejo no futuro… Velha… Sozinha…) Calma, Ana Márcia. (Triste…) Calma, respira. (Talvez até um pouco amarga…) Calma é o caralho! Cadê minha sacola do Guanabara???

Nunca fui nostálgica. Não sinto saudades da infância, da adolescência, da faculdade. Não pegaria o Delorian para voltar no tempo. Se hoje é o que tem pra hoje, pra mim tá beleza. Vivo demais no presente e sempre achei que isso fosse uma qualidade. O problema dessa minha existência é que quando o futuro assusta e o presente é incerto, fico sem ter quem me acolha.

E agora? E a crise? E o deserto? Quem poderá nos defender? Deus é uma boa alternativa sempre e em todas as suas formas, mas eu precisava de alguém que interagisse de forma um pouco mais verbal. Quem mais eu tenho nessa vida…?

Filhos? Não… Preciso poupá-los enquanto crianças… Minha família é longeva, de modo que devo precisar, em algum momento, de ajuda para banhar as pelancas e limpar minha própria bunda (quem melhor que os filhos para retribuir esse favor?). E quanto aos irmãos? Dá não. Estão todos acostumados a ignorar mimimi de irmã caçula (e eu fazia MUITO mimimi).

Vamos tentar o marido de novo. Tu, tu, tu, tá ocupado. Precisando ficar sozinho. Descansando a cabeça de um trabalho física e mentalmente exaustivo. Que marca de mulher eu seria se não respeitasse isso, né mermo? Tranquilo (só não vem depois querer companhia da cintura pra baixo. Huiahuiahuia).

Além do mais, você pode até ser princesa, mas tem que ser capaz de se salvar sozinha.

Hoje não tem marido, não tem amigo, não tem família. Dos olhos pra dentro me sinto irremediavelmente só, e essa sensação faz aquele vislumbre do futuro parecer inescapável. Agora sim, é a hora perfeita para entrar em pânico e ainda escrever uma crônica verborrágica pouco adequada à proposta do veículo que pretende publicá-la.

Mas leitor, veja bem… (Aliás, péra. Reparou que tá rolando um surto de conversar com vocês por aqui? Tudo maluca, repara não. Vocês estão apenas sendo usados para disfarçar essa coisa de falar sozinha. Sociedade não aceita bem, sabe cumé… Se a gente insiste vem logo um tio parrudo de jaleco branco.)

Mas então, vocês sabem que eu não costumo deixá-los ir sem um encerramento, uma moral da história. Preparados?

Nenhum homem é uma ilha e nenhum parceiro amoroso será sempre seu oásis.

Se não quer atravessar o deserto sozinho, tenha amigos e saiba mantê-los. Com sorte eles serão sua caravana.

Taí o máximo de amor que consegui hoje.

Perdoem essa quase velha, quase amarga, carente até os últimos cabelos brancos.

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Ana Márcia Cordeiro

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6 pensamentos sobre “Sobre desertos e oásis

  1. Oki disse:

    Já disse que tô aqui, viu? Talvez nem sempre eu consiga engatar uma longa conversação porque, infelizmente, eu AINDA preciso trabalhar de vez em quando… Mas veja: dos olhos para dentro, todo mundo está sozinho. Então ninguém está só no que se refere a solidão.
    É só esticar o bracinho para fora da concha e alcançar a alma solitária que esteja vagando mais próxima. :)

    • Ana Márcia Cordeiro disse:

      Simm! Já disse! E vai ter q sobreviver ao fato de estar na lista dos q serão importunados!!!!!! :-P

  2. Oki disse:

    Ah! E mais uma, ou melhor, duas coisas que respondi ao longo do texto e esqueci de comentar depois. Sim, porque você fala comigo no texto e eu respondo daqui, óbvio. Tá achando que patenteou a maluquice?
    A primeira é: não fique chateada com o seu oásis. Falando por mim: às vezes fico magoada porque o marido não adivinhou que eu estava precisando dele. Racionalmente, sei que ele não tem culpa, mas as emoções são idiotas. Então, faça um esforço pra enxergar que, sim, ele está muito aí pra você, no matter what. Talvez você só tenha escolhido um momento inadequado para aproximação e é muito provável que ele não tenha percebido o quanto você precisava dele naquele instante. Na verdade você não queria nem se aproximar, você queria que ele tomasse a iniciativa e salvasse a donzela em perigo. Mas aí lembrou que precisa saber se salvar sozinha. Racionalmente você lembrou, mas seu emocional idiota continua no alto da torre, chorando sozinho. Desce daí, sério.
    A segunda é: tem um jeito de não ficarmos sós dos olhos pra dentro. É só cultivar as pessoas no coração, e isso você já faz. Então, ao olhar pra dentro, veja que você não está sozinha aí. Eu e mais uma galera estamos aí fazendo baderna.

    • Ana Márcia Cordeiro disse:

      A baderna mais legal da cidade!!!!!! ♡♡♡

      (Não patenteei a loucura, mas tô pensando em registrar o bordão “desce da torre, Rapunzel!”)

  3. luz13 disse:

    Gostei do blog! Veja as previsões de Aline, da Cidade das Pirâmides, para o ano de 2014. https://www.youtube.com/watch?v=6v_iFO6_dyc Abraços

  4. Ah, como é difícil essa adultice e sua solidão… Ahhhh :(

    Tô numa semana super nostálgica tbm, me sentindo forever alone com meus trinta na porta: sem marido, sem namorado, sem filhos… Tenho uns poucos e bons amigos, mas todos casados. Mimimi solitário, ó céus.

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