Arquivo da tag: família

Casamento e quarentena

No final de março li algumas matérias dizendo que a China que registrou recorde de divórcio após a quarentena. Eram 14 por dia e os cartórios já estavam sem horário de atendimento. Não faço ideia de quantos casamentos tenham sido desfeitos e não procurei por esta informação. Mas, vivendo o período de distanciamento social no Brasil, não é difícil acreditar que aqui acontecerá o mesmo.

O distanciamento social a qual estamos sendo submetidos é importante para resguardar a saúde e bem-estar social. Escolas e universidades estão fechadas e a maioria delas substituiu as aulas presenciais por online,  empresas concederam férias aos empregados ou autorizaram o trabalho remoto, somente quem trabalha com serviços essenciais está circulando nas ruas e indo ao trabalho para assegurar que tenhamos o essencial para viver durante este período.

Tudo isso mudou a dinâmica familiar. Marido e mulher, pais e filhos, estão mais tempo juntos. Sem poder ir ao shopping, sem poder bater perna na rua, sem poder comer num lugar diferente, sem ir à praia, sem sair para trabalhar, sem deixar os filhos na escola, sem deixar as crianças na casa de parentes ou amiguinhos, sem visitar familiares, sem ir a festas. A casa virou ambiente familiar, corporativo, acadêmico. Quem tem filhos pequenos precisa acompanhar os estudos deles, além de dar conta do trabalho e cuidar dos fazeres domésticos.

Não está fácil para ninguém. Um isolamento imposto, do qual não sabemos quando iremos sair e não temos qualquer controle, é diferente de passar um final de semana em casa, de pijama o dia todo, porque optou por fazer isso. Mesmo reconhecendo a importância desta atitude agora e certos de que a casa é um lugar seguro, é normal sentir ansiedade, medo e insegurança em relação ao futuro.

Mas, diante de tantos relatos, arrisco dizer que no Brasil acontecerá o mesmo que na China: um recorde de divórcio depois que a quarentena terminar. Acredito que muitos casais já tinham problemas e ignoravam. Pelo bem dos filhos, por medo de ficar sozinhos, por vergonha da sociedade, por achar que as coisas um dia iriam mudar, por acreditar que casamento é assim mesmo. Eu não sei. Cada um tem suas razões.

Certamente, pessoas se desentendem, divergem, discordam. Inclusive pessoas que se amam. Uma pandemia mundial leva a muitas reflexões. E quando se trata de casamento muitos devem estar se perguntando: vale a pena continuar junto? Isso é um casamento feliz? É esse relacionamento que quero cultivar? Até que possam vir a perceber que o amor da sua vida não se encaixa mais na sua vida.

Se você está vivendo um problema conjugal nesta quarentena, procure ajuda profissional. Se já tinha um histórico de crise de ansiedade, depressão ou qualquer problema psicológico, procure ajuda profissional. A família não é responsável pelos seus problemas, é preciso se ajudar para ser ajudado. Atendimentos online estão autorizados e são importantes neste momento.

Se você é casado, tem filhos, e toda essa mudança repentina em sua rotina não está causando grandes problemas, sinta-se privilegiado e agradeça por isso.

Esse momento vai passar. Tudo vai passar.

linhaassinatura_GISELI

 

Etiquetado , , , , , , , , ,

“Eu estudo para ser mãe”

Esta semana, durante o almoço, eu me sentei em uma mesa com três mulheres desconhecidas que conversavam sobre os filhos e os desafios da maternidade. Mesmo se eu quisesse não teria como não ouvir a conversa e fiquei acompanhando.

Pelo que conversavam eram mães de crianças ainda pequenas e trocavam informações sobre comportamento infantil. Uma delas tinha ido em uma palestra e apontava atitudes comuns a mães de primeira viagem que atrapalhavam o desenvolvimento dos filhos. Ainda citou e indicou alguns livros.

Em um dado momento da conversa, depois de ser questionada sobre a eficácia da Comunicação Não-Violenta com as crianças, essa mulher respondeu “eu estudo para ser mãe!”. Eu nem sei descrever o que senti naquele momento! Lembrei dos tantos livros que comprei quando o meu filho era criança e o quanto julgamos que a maternidade é um dom que todas as mulheres têm.

Pesquisamos e estudamos sobre tantas coisas, mas somos levadas a acreditar que, com uma criança nos braços, saberemos o que fazer. Instintivamente. Automaticamente. Milagrosamente. Que saberemos interpretar todas os comportamentos dos filhos e suprir todas as necessidades.

É claro que, mesmo lendo os melhores livros sobre Educação Infantil, indo em palestras, assistindo vídeos e filmes, algumas soluções são terão sido descritas. Ou não saberemos identificar no momento exato em que acontecem. Mas estudar ajuda sim. Ou, na pior das hipóteses, nos torna mais humildes diante da maternidade.

Filhos não são extensão dos pais, não devem suprir nossas expectativas, não nasceram para fazer nossas vontades e simplesmente obedecer a nossos caprichos. Por outro lado, não somos escravos dos filhos. É difícil lidar com os caprichos da infância com equilíbrio, ensinando autonomia e independência.

Ninguém nasce mãe. A cada dia que passa aprendemos um pouco mais. E julgar que não sabemos tudo, que podemos falhar, que temos como aprender, que existem pesquisas que podem auxiliar só demonstra que temos, além da enorme vontade de ser uma mãe melhor para nossos filhos, todo amor do mundo em nosso coração.

Ler sobre maternidade, desenvolvimento e educação infantil, ainda que na prática a teoria seja outra, nos ensina a amar sem soberba e autoritarismo. E, principalmente, a identificar quando os filhos precisam de ajuda profissional.

Crônica publicada no blog de Giseli Rodrigues em 16 de junho de 2019.

linhaassinatura_GISELI

Etiquetado , , , , , , , ,

Parem de tratar marido como filho

Eu vejo mulheres sobrecarregadas todos os dias. Mulheres que estudam e trabalham tanto quanto seus maridos, ou mais, e ainda se sentem responsáveis por chegar em casa, fazer o jantar, pôr a mesa para família e aprontar as coisas dos filhos para o dia seguinte.

Sabemos que amar dá trabalho. Que relação exige cuidados. Que filhos precisam dos pais. Mas geralmente só quem cuida, quem tem trabalho e se preocupa com a cria é a mãe. E isso precisa mudar. A educação dos meninos precisa mudar, as escolas precisam mudar, todo esse sistema precisa mudar, mas enquanto as mudanças não chegam eu quero falar com as mulheres.

O homem com quem você se casou é capaz de ligar uma máquina de lavar, de colocar a roupa na corda, de esquentar a própria de comida, de arrumar a cama, de ler a agenda do filho, de escrever recado para os professores. Inacreditavelmente tudo que você faz ele também é capaz de fazer. Portanto, deixe que faça.

Você não é mãe do seu marido. Não o trate como filho. E mais: também não trate seu filho, principalmente se for um menino, como se fosse incapaz de realizar tarefas domésticas. Lavar a própria louça, recolher o lixo, arrumar a cama é educação. Não precisa esperar que peçam, não precisa esperar a empregada fazer. Ensinem a independência, o autocuidado, a ajuda mútua.

Você não precisa fazer tudo sozinha. Não tem que fazer tudo sozinha. Se o amor da sua vida ainda não faz por iniciativa própria, peça. Isso mesmo: peça. Não precisa gritar, não precisa espernear, não precisa reclamar nem lamuriar.

Gritar “você não faz nada”, “tudo eu”, ‘sempre que eu faço”, “estou cansada de fazer tudo sozinha”, por mais que seja a mais pura verdade, só vai dificultar ainda mais as coisas. Peça ajuda. Diga que ele é melhor em matemática e pode ajudar o filho com o dever de casa. A caminho do trabalho ligue e já avisa que ele precisa esquentar a comida. Enquanto faz comida, peça que arrume a mesa. Combine que um faz a combina e o outro lave a louça.

Culturalmente somos educadas a ser donas de casa e cuidar dos maridos, mas a vida mudou. Também trabalhamos fora de casa, temos uma vida profissional, estudamos e estamos tão ocupadas quanto nossos parceiros. Então, se somos capazes de trabalhar fora como eles, eles são capazes de trabalhar dentro de casa como as mulheres sempre fizeram.

Vejo homens que já viveram sozinhos, que faziam de tudo, não fazerem absolutamente nada depois de casados. Que não sabem onde estão guardados os utensílios. Não permitam isso. Homens podem, e devem contribuir com os afazeres domésticos. Isso não é coisa de mulher. É coisa de gente adulta, madura, que precisa organizar a vida. E a casa.

Marido é uma coisa, filho é outra. Quando as relações não têm seu papel definido tendem a se deteriorar. Portanto, não ser responsável por tudo sozinha é também uma maneira de preservar a relação, de manter o amor, o respeito e a admiração pelo parceiro. Não assuma toda a responsabilidade pela relação, pela casa e pela vida da família. Relações servem para criar laços, parceria e rede de ajuda mútua.

Trate seu marido como o adulto que ele é.

linhaassinatura_GISELI

Etiquetado , , , , , , ,
%d blogueiros gostam disto: