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Romântica Enrustida

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Já era madrugada quando o telefone tocou. Era a minha avó. Também estava com insônia e, sabendo que eu sofro do mesmo mal, me ligou para colocar a conversa em dia. As coisas não mudaram muito desde a época em que ficávamos acordadas até tarde na sala da casa dela, assistindo o programa do Jô, conversando e fazendo crochê. Pensando bem, mudaram sim. Tudo mudou. Menos o fato de continuarmos insones, ela lá e eu cá.

E aí quando eu me vejo às gargalhadas, escutando a minha avó contando sobre como ela fazia para livrar-se do meu avô que, aos 87 e gozando de uma saúde bem precária, ainda teimava em dar umas investidas sexuais na relação – sem sucesso, pois minha véia já não queria mais saber dessas saliências há muito tempo – eu percebo que não tenho uma família, tenho amigos. O que, com muita sorte, dá na mesmo.

É claro que nem todo mundo lá em casa é assim, tão moderninho. Minha irmã, por exemplo, tem quase a mesma idade que eu e é mais conservadora do que a minha mãe e a minha avó juntas. Eu jamais a incomodaria com uma ligação interurbana para contar sobre uma frustração sexual, por exemplo, como já fiz com a minha mãe. Mais de uma vez. (desculpa aí, mãe!)

Minha mãe e eu já fizemos compras em sex shop juntas. Pois. Diante disso é difícil imaginar que falar sobre sexo seja embaraçoso pra mim ou que haja qualquer outro assunto que me intimide ou me bloqueie. Mas há. Ninguém é assim tão bem resolvido a ponto de conseguir transitar descalço por todos os universos com a maior segurança do mundo, sem medo de entrar um espinho no pé ou de pisar num caco de vidro.

O que me intimida? O amor. Esse bicho de sete cabeças grandes e monstruosas, com cara de bicho papão. Amor e matemática. São duas coisas que – dizem – têm lógica, mas eu não compreendo lá muito bem. Faria sentido para mim se fosse uma equação mais ou menos assim: eu + você + amor = felicidade. Mas sempre tem algo a mais. Ou a menos.

Falo do amor romântico, desse que faz a gente se imaginar vestida de branco num altar, segurando um buquê de flores e dizendo sim para um noivo bonitão tipo o Ken da Barbie. E se eu falo tanto sobre o amor e se escrevo sobre ele com uma frequência considerável, não significa que eu saiba o que estou dizendo sempre. Sinto decepcioná-los caros leitores, mas, às vezes, eu não faço a menor ideia.

Bom, eu idealizo. Nisso eu sou boa. Eu invento. Eu crio. E até vivo alguma coisa do que eu escrevo de vez em quando. Não é como se eu não soubesse nada a respeito do amor. Mas não é como se eu soubesse tudo também. Eu penso que sei o bastante, mas posso estar equivocada, tanto que se você me surpreender com um pergunta do tipo “o que é o amor?”, eu vou demorar tanto para te responder quando se você me perguntar quanto é sete vezes oito.

Calma, eu ainda tô pensando! … Cinquenta e seis? Certo? Certo!

Ah… você quer saber do que eu penso sobre o amor? Bom. Isso é muito relativo. Vai de pessoa para pessoa, depende. Tá… eu tô enrolando. Tá vendo? Eu me perco. Não fui preparada para isso. A verdade é que os tempos mudaram, o amor romântico tá na moda de novo, é a tendência dessa estação e, ao que tudo indica, da próxima também, e eu sou péssima para seguir qualquer tipo de modismo. Tenho meu próprio estilo de mulher moderna, independente e… bom, de romântica enrustida.

Veja bem, os tempos são outros. Eu nasci numa época em que as mulheres sonham com carreiras de sucesso e cargos importantes. Um bom marido, na maior parte das vezes, funciona como um acessório de enfeite, um brinco de diamantes, uma pulseira de ouro ou um anel de esmeralda. Em suma: virou artigo de luxo. Muitas sonham, poucas têm. A maioria acaba se conformando em conseguir ser bem sucedida profissionalmente. Embora haja quem ande por aí, exibindo um amor falsificado pendurado na orelha.

amaréFosse o amor tão simples como nas figurinhas do “Amar é…”, seria tudo mais interessante e divertido. E talvez seja. A gente é que complica, idealiza demais e realiza de menos. O meu amor talvez seja como o meu álbum de figurinhas do Amar é… que, desde criança, eu colecionava e já naquela época eu devia ser uma romântica em potencial, que acabou se retraindo. A coleção ainda não tá completa e eu ainda tô saindo do armário aos poucos. Mas agora, olhando para essas figurinhas todas, amar me parece coisa demais.

Amar é coisa que muita gente tenta. Amar é muita coisa para quem tenta. Amar é coisa de gente grande em figurinha para criança. Amar é coisa muita pra pouca gente e pra muita gente, é pouca coisa.

Pra mim (respondendo, por fim, à fatídica pergunta), o amor não é para amadores, é coisa séria – que eu, de fato, levo muito a sério – talvez por isso eu pise com tanto cuidado nesse terreno.

Acho que o amor é um não-ideal. Não tem fórmula, lógica, razão nem por quê. O amor deve ser qualquer coisa parecida com essa vontade insubstituível e irresistível de acordar e ver aquela mesma pessoa ali, do mesmo lado da cama todos os dias. O resto inventa-se, o resto dá-se o nome que quiser…

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