Tarde demais, baby…

A diva Greta Gargo dando aquela esnobada básica no bofe Robert Taylor

A diva Greta Gargo dando aquela esnobada básica no bofe Robert Taylor

Ela estava aí, do seu lado todo o tempo, e só agora que ela foi embora você percebeu o quanto a ama e que não pode viver sem ela. Aí você saiu feito um louco pela rua, pegou um táxi, mandou o motorista acelerar o máximo que pudesse, mas o trânsito estava completamente congestionado, então você abandonou o táxi e foi correndo mesmo, entrou no aeroporto empurrando as pessoas, se desculpando, tropeçando e derrubando as bagagens que estavam pelo caminho, mas quando chegou no portão de embarque, para o seu desespero, ela já havia entrado no avião, que decolaria nos próximos minutos. Você tentou ultrapassar o portão mesmo assim, mas, obviamente foi barrado pelos seguranças porque estava sem o bilhete de embarque. Aí você pediu – na verdade você implorou – para que te deixassem passar, argumentou que o amor da sua vida estava dentro daquele avião e que se você não a impedisse, ela partiria para nunca mais voltar. Ficaram comovidos e, com alguma resistência, deixaram você entrar. Quando você alcançou o avião, a tripulação já havia sido avisada e estava à sua espera, a aeromoça (particularmente emocionada) comunicou aos passageiros o motivo do atraso do voo e chamou sua amada pelo nome, que se levantou, sem entender nada, até o momento em que te viu vindo ao encontro dela. Vocês trocaram olhares apaixonados. Ela quis que você explicasse o que estava fazendo ali, e você finalmente disse, em alto e bom tom, que não conseguia imaginar sua vida sem ela e a pediu em casamento. Ouviu-se um coro de comoção (“Óhhhhhh” ) dentro do avião. Ela disse sim e vocês se beijaram demoradamente, enquanto os passageiros aplaudiam entusiasmados aquela cena de amor. A aeromoça suspirou, desejando viver um amor assim algum dia, e…

The End.

Começam a subir os créditos do filme, música do Roxette tocando ao fundo, as luzes da sala do cinema se acendem, os espectadores começam a se levantar aos poucos, um se espreguiça daqui, outro boceja de lá. Alguns casais resistem sentados, aos beijos, envolvidos pelo clima do romantismo cinematográfico mas, cedo ou tarde terão que levantar, dar as mãos e voltar para a vida real sem legenda e trilha sonora para colaborar.

Eu não satirizo o amor romântico, só acho que certas coisas só funcionam bem nas telas do cinema, isto é, quando funcionam. Esse roteiro onde o mocinho passa o filme inteiro sem notar o amor platônico da mocinha e só lááá no final descobre o seu amor por ela, ou da fulaninha que durante toda a estória não dá o devido valor ao fulaninho e no fim, depois de se estrepar toda, decide voltar porque descobre que é dele que ela gosta e os dois vivem felizes para sempre não cola… não mais.

Pode ser que um dia eu entenda, mas acho pouco provável, se tem uma dúvida que levo comigo dessa vida é essa: por que as pessoas só dão valor depois que perdem?

Teoricamente não seria mais simples valorizar o que está ao alcance das mãos, diante dos olhos do coração? Então, por que na prática é tão diferente? É como se alguma coisa encobrisse a visão enquanto você ainda tem ao seu dispor e depois, ao perder, como num passe de mágica, você passasse a enxergar o que antes, misteriosamente, não via o que estava a um palmo do seu nariz.

Por que tentar fazer tudo diferente só agora que eu não te quero mais? – foi a pergunta que fiz, anos atrás, para um ex-namorado. Não sei… – foi o que ele me respondeu com franqueza. Pois é, nem eu sabia, e ainda não sei e, provavelmente, nunca vou saber, tampouco entender. Porque os anos passam e eu vejo as pessoas cometendo os mesmos erros tolos, de olhos vendados, perdendo de vista grandes amores, deixando escapar a magia do relacionamento construído no cotidiano a dois, para depois terem tristes estórias de amor para – não – contar. Sim, porque, me desculpem, mas, eu não tenho interesse em escutar.

E eu espero que as chances tão logo se esgotem para os que não sabem aproveitar, porque é puro desperdício de tempo e desgaste do amor que, se ainda não se esgotou, pouco sobrou para gastar. E eu não quero que ele termine com ela no final. Eu quero que o bonitão lá entre no avião e, por conta do atraso do voo, os passageiros estejam esbravejando contra ele, que irá encontrá-la acompanhada de um cara bem mais gato e apaixonado por ela agora! Exatamente agora, quando ela também está apaixonada por ele, e não amanhã, ano que vem, na próxima encarnação… quando ela, cansada de amar por dois, já tiver ido embora. Eu quero é ver gente se amando “tudo-junto-ao-mesmo-tempo-agora”, não em tempos e mundos distintos. Quero escutar falar de estórias de amor que começam e terminam juntas, embora, fatalmente, tantos acabem separados antes do fim. Mesmo assim, o que eu quero é ver recíprocos começos, meios e fins de amor mútuo, independente do desfecho, um “durante feliz”, porque “final feliz” só não me apetece, nem me convence… não mais.

E você, meu bem, trate de se engraçar com a aeromoça que se derreteu toda com seu romantismo descartável e seu amor tardio, porque dessa vez – confesso que sinto um prazer cretino em dizer isso – você até alcançou o avião, mas chegou tarde demais, baby.

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3 pensamentos sobre “Tarde demais, baby…

  1. Meu sonho é viver esta cena!
    (quem nunca???)

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