Quanto tempo ainda nos resta?

A única certeza que temos é de que iremos morrer algum dia. Não sabemos como, nem quando, nem onde. A cada novo amanhecer não sabemos se estamos vivendo mais um dia ou menos um dia – provavelmente os dois, dependendo da perspectiva. Pouco falamos sobre morte, não gostamos de falar sobre ela e não planejamos como vai ser a vida quando não estivermos mais aqui.

A morte é uma tragédia. Só quem já viveu a perda de um ente querido conhece essa dor. Não encontro palavras para descrever, porque simplesmente não há. Um novo mundo passa a existir a partir da morte de alguém que faz parte da nossa vida. Rituais que eram importantes passam a não ter significado, coisas simples e cotidianas povoam nossa memória, a saudade surge em momentos inimagináveis.

Pessoas que fazem parte das nossas vidas, que ajudaram a construir nossa história, não são substituíveis. Elas vivem para sempre dentro de nós. Há algo delas em nós. Por mais que a pessoa não exista fisicamente, ela continua existindo. E continuará existindo enquanto fizer parte das nossas lembranças, memórias, experiências. Continuará enquanto estivermos vivos.

Por outro lado, falar de morte é falar da vida. Se não há para onde fugir, de que maneira queremos ser lembrados quando não estivermos aqui? O que queremos deixar para quem amamos? Que tipo de relações desejamos construir e manter? Ao lado de quais pessoas queremos viver momentos e construir lembranças? O que desejamos da vida?

Hoje passei a manhã vendo notícias do temporal que aconteceu em Petrópolis, no dia 15 de fevereiro de 2022, e isso mexeu muito comigo. Não foi a primeira tragédia e, infelizmente, não será a última. Famílias destruídas, 58 mortos até o momento em que vi a reportagem e um número desconhecido de desaparecidos.

Pessoas voltando do trabalho, da escola, assistindo televisão em casa, fazendo uma atividade doméstica ou qualquer outra coisa cotidiana numa terça-feira comum e, de repente, ela é atingida por uma forte chuva e não existe mais. Nenhum de nós imagina uma morte assim, nenhum de nós quer passar por uma tragédia, mas nenhum de nós sabe quando chegará o fim. E, inevitavelmente, ele chegará.

Como já escreveu Bukowski, “todos morrem um dia, é simples matemática. Nada de novo. A espera é que é um problema.” De que maneira estamos esperando? O que estamos fazendo durante o intervalo? Se morrêssemos hoje, teríamos orgulho do que construímos? De que maneira seríamos lembrados?

Eu sei que diante da necessidade de lutar pela vida, sobretudo num país como o nosso, muitas pessoas não conseguem viver. Mas se você é uma das pessoas que pode, encontre uma brecha entre os compromissos, responsabilidades e obrigações para fazer coisas que te deem prazer, estar com pessoas que admira, criar momentos com quem você ama. Elogie as pessoas, diga eu te amo, compartilhe o que sabe.

Ninguém sabe quanto tempo ainda resta, mas no dia em que você não estiver mais aqui (e eu desejo que este dia demore bastante a chegar) não é dos momentos especiais que terão saudade, mas dos momentos simples e cotidianos que um dia compartilharam. Busque a sua felicidade. É sendo feliz que você fará feliz quem te ama. E aqueles que te amam lembrarão de você eternamente.

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O que te faz ficar?

Li recentemente que o Brasil registrou um novo recorde de divórcios no primeiro semestre de 2021. De acordo com dados do Colégio Notarial do Brasil, de janeiro a junho de 2021, foram 37.083 divórcios, um aumento de 24% em relação ao primeiro semestre de 2020.

Quem me conhece sabe que considero a possibilidade de se divorciar uma conquista muito importante. Ficar casado a vida inteira, como nossos antigos avós faziam, não é sinônimo de felicidade. Todos nós conhecemos histórias de mulheres que sofrem violência doméstica, que viveram relacionamentos infelizes, mas não podiam se separar. Esse texto, no entanto, não é sobre isso.

Este texto é sobre as pessoas que, contrariando as estatísticas, permaneceram junto dos seus parceiros. Pessoas que, em algum momento, podem ter pensado em se separar, mas concluíram que o relacionamento valia a pena, que era importante, que desejava ficar. E a minha pergunta é: o que te faz ficar nessa relação?

Somos todos seres imperfeitos e nos relacionamos com pessoas imperfeitas. Chatas. Mandonas. Teimosas. Convencidas. Ansiosas. Inseguras. Dramáticas. Gastadeiras. Implicantes. Quietas. Falantes. Eu não conheço a pessoa com quem você convive e qual (ou quais) característica te incomoda. Mas tem uma. Ou mais de uma.

Essa mesma pessoa, no entanto, tem características que te agradam, que te enchem de orgulho, que te fazem acreditar no amor, que fazem com que você decida ficar. Dia após dia. Mês após mês. Ano após ano. E quanto tempo isso faz? Há quanto tempo estão juntos? O que te encantou, lá no início? Por que decidiu dividir a vida com essa pessoa?

Agora, depois de passado algum tempo, ela é a mesma pessoa? O que mudou? O que ainda permanece? O quanto você mudou? O quanto dessa pessoa há em você? E, passadas tantas experiências juntos, boas e ruins, o que te fez ficar, mesmo com toda possibilidade de ir embora? Você já parou para pensar sobre isso?

O amor é importante, claro. Se o casal se ama – ou ainda se ama – tem aí uma grande vantagem. Mas um relacionamento duradouro é construído diariamente por pessoas que, apesar de toda a facilidade de ir embora, resolvem ficar. Decidem compartilhar planos, sonhos e viver juntos quando poderia ser mais fácil estarem separados.

O amor é uma coisa boa, mas não é uma coisa fácil. Se você está feliz com quem ama não considere isso pouca coisa. Celebre a decisão de ficar. Demonstre a felicidade de ficar.

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Um casal, dois inteiros

Como boa canceriana, sou romântica e acho lindo quando leio metade da laranja, alma gêmea, tampa da panela para se referir ao par amoroso. E já usei. Mas o que aprendi ao longo dos anos é que só duas pessoas inteiras podem construir um relacionamento saudável e feliz. Metades não se completam, pois, simplesmente, não existem.

Mas o que é ser inteiro se estamos em constante mudança, aprendemos a cada dia e convivemos com a frustação de que sempre há uma falta em nós mesmos? Ser inteiro é isso: a constatação de que somos incompletos, mas não há uma outra pessoa no mundo que completará o nosso vazio existencial.

O amor é lindo. Viver com alguém pode ser uma experiência maravilhosa se aceitarmos que não cabe a outra pessoa a responsabilidade de nos fazer felizes e que, ao encontrar o amor, não nos tornaremos seres completos. Continuaremos sendo o que sempre fomos, nós mesmos.

Relações duradouras ensinam bastante e percebemos que não somos mais quem éramos no início do relacionamento. O amor, a convivência, a vontade de querer que dê certo, com certeza, impactam a vida de cada um de nós. Mas todo amor nos transforma. A maternidade e a amizade, por exemplo, estão aí para provar.

Parece óbvio, e é, mas o óbvio precisa ser dito: depois que a paixão acaba e você enxerga a pessoa tal como ela é, o relacionamento não sobrevive se você não tiver consciência de que ninguém no mundo, a não ser você mesmo, pode atender as suas expectativas. O outro é o outro. Com qualidades, defeitos, erros, acertos. Uma pessoa comum, como tantas.

Não aceite um amor menor do que você merece, mas não caia na tentação de buscar eternamente alguém que não existe: a sua metade.  

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Por mais mimimi

“Hoje em dia não se pode falar mais nada”, “antigamente que era bom”, “hoje em dia tudo é preconceito”, “não se pode mais fazer uma piada, que já vem alguém de mimimi”. Quem nunca ouviu uma dessas frases? Ou todas? A narrativa de que as pessoas, principalmente as da nova geração, são vitimistas, irresponsáveis e reclamam de tudo, está presente no nosso dia a dia.

E eu fico muito feliz e orgulhosa que hoje em dia questionamos todo tipo de preconceito e lutamos pelas minorias. Se ofende alguém, não é piada. Se a geração anterior fosse tão boa estaríamos hoje no fundo do poço. Não reclamem de quem está lutando por uma sociedade melhor, mais justa, igualitária e humana.

Não desqualifique as batalhas alheias. Ouça. Reflita. Entenda que o mundo não gira em torno do seu umbigo e que, se você for mesmo uma pessoa engraçada, vai conseguir fazer uma piada sem ofender negros, homossexuais e mulheres. E, se ofender, temos sim, o direito de dizer isso. E exigir o mínimo: respeito.

Pare de olhar para trás e buscar justificativas para não mudar os seus comportamentos preconceituosos. O mundo precisa mudar. As pessoas precisam ser aceitas como são. Não compactuar com racismo, sexismo, machismo, xenofobia, LGBTfobia não é ser mimizento (essa palavra existe?), é ser humano.

O mundo está ficando chato para as pessoas que estavam destilando seus preconceitos sem serem questionadas e hoje usam justificativas como “apanhei e não morri”, “sofri bullying e estou aqui”, que ótimo. Mas quantos não estão? E desde quando ter sofrido um preconceito é motivo para desejar que os outros também sofram? É importante refletir e não aceitar as nossas próprias vivências como únicas maneiras de existir, afinal o mundo vai muito além de nossas experiências e, certamente, há quem tenha apanhado ou sofrido bullying, carregando muitos traumas.

Eu desejo que as pessoas continuem lutando por seus direitos, apontem os preconceitos e exijam uma sociedade mais justa. Se lutar contra a repressão e preconceito é mimimi estou aqui para dizer: por mais mimimi, porque ainda está pouco.

Texto publicado no blog pessoal da autora Giseli Rodrigues.

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Como melhorar a vida a dois

Se você começou a ler esse texto pensando em encontrar fórmulas prontas, pode parar por aqui. Quando se trata de relacionamento, qualquer que seja ele, não existe receita, bula, fórmula ou mágica. Existe comprometimento, vontade de fazer dar certo e muito amor. Então esse texto nem precisaria ser escrito, certo? Errado. O óbvio também precisa ser dito.

Dividir a vida com alguém é um desafio, os casais podem confirmar. Mas quando a gente se apaixona e comete a loucura de morar sob o mesmo teto, juntar as escovas de dentes e compartilhar a vida, começa a ter a real compreensão do que é um relacionamento e a ver as relações familiares sob uma nova perspectiva.

Cada um foi criado de uma maneira, são mundos distintos que se unem e, em algum momento, isso traz conflitos. Passada a paixão, as diferenças trarão conflitos. Mas se há amor e maturidade também haverá aprendizado, crescimento e consolidação da relação. De todas as coisas que lemos sobre relacionamento, a mais verdadeira e importante é que o amor se constrói no dia a dia. Todos os dias.

É fundamental expressar o que incomoda, mas essencial reconhecer que o outro não é uma extensão de si mesmo e não nasceu para suprir as suas expectativas. Pense nas coisas que realmente são importantes e que fazem diferença no dia a dia, não fique discutindo o que não é primordial. Vários relacionamentos se desgastam por pequenas discussões desnecessárias.

Tão importante quanto falar o que desagrada, é reconhecer o que é positivo. Com o passar dos anos o hábito de agradecer ao outro por pequenas gentilezas e reconhecer os méritos acaba sendo esquecido, recupere isso. Elogie, agradeça, reconheça. Não acredite que o outro já sabe o que você acha.

Estar junto precisa significar parceria, amizade, confiança e cumplicidade. E talvez esteja aqui a grande lição deste texto: isso não depende só de você. Ame, se comprometa, se dedique, demonstre amor, mas não insista em uma relação que não é recíproca. Por maior que seja o amor, não dá para amar pelos dois.

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